DOM MARCUS ANTONIUS CARD. DI VEGESELA
POR MERCÊ DE DEUS E DA SANTA SÉ APOSTÓLICA
CARDEAL PROTO-PRESBÍTERO DEL SACRO CUORE DI GESÚ A CASTRO PRETÓRIO
PREFEITO DA CONGREGAÇÃO PARA OS BISPOS
À Sua Excelência Reverendíssima, Dom Eugênio Lorscheider;
Ao Reverendo Mons. João Felipe Guimaraes;
Ao Reverendo Pe. Valdir Filho;
Ao Reverendo Miguel Dolezzio;
Saúde e Paz!
Foi enviada à mim na noite de 23 de março de 2022, carta assinada pelos senhores supracitados, em nome da chamada "Associação Sacerdotal Jequitinhonhense", cobrando desta Sagrada Congregação uma posição frente os fatos que se sucederam na III Sessão do Concílio Vaticano I.
Na carta, os reverendos citam os conflitos e divergências de opiniões que resultaram em uma troca de ofensas, onde sua excelência, Dom Eugênio, viu-se atacado pelas posições que defendeu. Devemos aqui ponderar que, em uma sessão conciliar, é perfeitamente natural que hajam divergências de opiniões. O debate deve ser livre e aberto, desde que haja o respeito mútuo para saber acolher e ouvir o outro. Reconhecemos que no transcurso do debate, nossas emoções humanas podem trair-nos, de modo que o respeito necessário entre as partes se quebra. Deste modo, devemos reconhecer com humildade que houve excessos de ambas as partes.
A Igreja, como mãe que acolhe seus filhos em suas diferenças, deve assegurar a todos o direito salutar de viverem sua fé e espiritualidade de acordo com o carisma que comungam. Deus nos fez para a diversidade. Muitos e diversos são os dons e maneiras que o Senhor se manifesta e deixa-se encontrar. Essa diversidade de dons e carismas é a beleza e riqueza da Igreja, e não podemos permitir que determinado grupo se imponha sobre o outro, excluindo assim a sadia pluralidade que nos congrega.
No entanto, é preciso ponderar também que, aquilo que se decide em Concílio é feito não por imposição, mas com a ajuda do Espírito Santo, é decidido após longo debate, onde todos têm direito a fala e ao voto. Ser Igreja também significa saber acolher aquilo que nos é proposto, mesmo que num primeiro momento pareça fugir às nossas convicções. Se acreditamos de verdade que o é o Espírito Divino que move a Igreja, devemos acolher com humildade e mansidão o que esta mesma Igreja nos propõe. Isso não significa que o debate se encerra, mas significa que ações de revolta, que se levantam contra a mesma Igreja em sinal de divisão só irão conduzir a um caminho destrutivo e irreversível de quebra de comunhão, ferindo gravemente o corpo místico de Cristo.
"Todo reino dividido contra si mesmo será arruinado, e toda cidade ou casa dividida contra si mesma não subsistirá", diz Jesus (cf. Mt 12,25). Se causamos divisão entre nós mesmos, como seremos então sinais e sacramentos de unidade para o mundo? Se entre nós reina a desordem e confusão, que valor terá o nosso testemunho cristão diante dos homens? Se queremos mudança na Igreja, a mudança deve partir primeiramente de nós mesmos!
Os reverendos padres, na carta que me enviaram, citam a Constituição Pastoral Gaudium et Spes, evocando a liberdade a que tem direito a Igreja de questionar acerca das realidades sociais, sempre que o bem comum ou a salvação humana o exigirem. Tal citação não cabe no contexto que tratamos nesta carta. Tratamos aqui da falta de colegialidade, de senso de respeito e de falta de apartidarismo que temos observado no Concílio de todas as partes!!
Espero, com a graça de Deus, que todos possamos parar um pouco e refletir sobre as atitudes que vimos tomando. "A mensagem evangélica, tão em harmonia com os mais altos desejos e aspirações do género humano, brilha assim com novo esplendor nos tempos de hoje, ao proclamar felizes os construtores da paz «porque serão chamados filhos de Deus» (Mt. 5,9)". [1]
Vaticano, 23 de março de 2022.
+ Marcus Antonius Card. Di Vegesela
Prefeito da Congregação para os Bispos