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Carta Haec Porta Domini | Sobre o autêntico Culto ao Sagrado Coração de Jesus

 


CONGREGATIO PRO DOCTRINA FIDEI
CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ

"HAEC PORTA DOMINI"

Sobre o autêntico Culto ao Sagrado Coração de Jesus

“Esta é a Porta do Senhor, pela qual os justos entrarão” (Sl 117,20). Estas palavras do salmista bem se aplicam ao Coração de Jesus. Ele é a porta por meio da qual os homens conhecem e experimentam o amor infinito de Deus. No símbolo do Coração de Jesus, podemos contemplar a imensa caridade com a qual o Senhor nos acolhe, podendo assim nos assemelhar ao seu coração em nosso trato com os irmãos e irmãs.

A devoção ao Coração Sagrado de Jesus, nos moldes que conhecemos hoje, remonta ao século XVII, quando São João Eudes inaugura em sua Congregação o Culto ao Sarado Coração de Jesus. Posteriormente, em 1673 Santa Margarida Maria Alacoque recebe as revelações privadas do próprio Senhor que, dentre muitos pedidos de reparação e desagravo, pede a instauração da Festa litúrgica em honra seu Sacratíssimo Coração na Oitava da Solenidade de Corpus Christi. “Na realidade, independentemente de toda revelação privada, e secundando só os desejos dos féis, por decreto de 25 de janeiro de 1765, aprovado pelo nosso predecessor Clemente XIII, a 6 de fevereiro do mesmo ano, a Sagrada Congregação dos Ritos concedeu aos bispos da Polônia e à arquiconfraria romana do sagrado coração de Jesus a faculdade de celebrar a festa litúrgica. Com esse ato, quis a Santa Sé que tomasse novo incremento um culto já em vigor, cujo fim era "reavivar simbolicamente a lembrança do amor divino" que levara o Salvador a fazer-se vítima de expiação pelos pecados dos homens.” [1]

Foi enfim, no século XIX, com Decreto da Sagrada Congregação dos Ritos de 23 de agosto de 1856, o Papa Pio IX estende a todo orbe católico a Festa do Sagrado Coração de Jesus. Ainda Leão XIII, Pio XI e Pio XII também ofereceram preciosas encíclicas por meio das quais incentivavam e realçavam a importância desta devoção (Anuum Sacrum 1899; Miserentissimus Redemptor 1928; Haurietis Aquas 1956).

A natureza do culto ao Sagrado Coração de Jesus, antes de tudo, está profundamente embasada nas Sagradas Escrituras. Isto porque é o culto ao próprio amor, que é Deus: “Aquele que não ama não conhece a Deus, pois Deus é amor (1 João 4,8). Muitas passagens poderíamos citar para demonstrar o amor de Deus, que em Jesus se manifesta a nós. Podemos, contudo, sintetizar nas palavras de São Paulo aos Efésios: “Que Cristo habite pela fé nos vossos corações; a fim de que, estando arraigados e fundados no amor, possam perfeitamente compreender, com todos os santos, qual seja a largura, e o comprimento, a altura, e a profundidade, e conhecer o amor de Cristo, que excede todo o entendimento, para que sejais cheios de toda a plenitude de Deus” (Ef 3, 17-19).

Em segundo lugar, o culto ao Coração de Jesus refere-se ao próprio Verbo encarnado. Não é ao Coração de carne, em si mesmo, que prestamos adoração, mas àquilo que ele é e significa. Deus feito homem em seu amor. Observa o Teólogo Karl Adam: “O devoto do Sagrado Coração de Jesus não pode esquecer jamais que o Coração é só uma representação de algo muito mais profundo: o mundo interior do Senhor. Quando o mendigo oscula a mão de seu benfeitor, porque simboliza a bondade e a generosidade do benfeitor, a homenagem à mão significa o próprio benfeitor. No símbolo do Coração, nós adoramos o próprio Jesus, que derramou o seu sangue por nós” [2]

Por isso é tão importante situar o objetivo desta devoção: louvar o amor infinito de Deus, e comunica-lo ao mundo para que ele seja mais amado. Todavia, como ensina o grande Santo Agostinho de Hipona: “ninguém ama aquilo que não conhece”. Como querer que o mundo ame em verdade e profundidade a Deus, se nós que o conhecemos e amamos falhamos na missão de ser comunicadores desse amor? Portanto, o autentico devoto do Sagrado Coração de Jesus não pode se alienar nas práticas devocionais externas e individuais. Deve ser um ardoroso apóstolo do amor, que evangeliza através da vivencia coerente de sua fé.

Pio XII, em sua Encíclica “Haurietis Aquas”, no centenário da aprovação da Festa Litúrgica do Sagrado Coração de Jesus, destaca: “À vista de tantos males que, hoje como nunca, transtornaram profundamente os indivíduos, as famílias, as nações e o orbe inteiro, onde acharmos, veneráveis irmãos, um remédio eficaz? Poderemos encontrar alguma devoção que se avantaje ao culto augustíssimo do coração de Jesus, que corresponda melhor à índole própria da fé católica, que com mais eficácia satisfaça as necessidades atuais da Igreja e do gênero humano? Que homenagem religiosa mais nobre, mais suave e mais salutar do que este culto que se dirige todo à própria caridade de Deus? Por último, que pode haver de mais eficaz do que a caridade de Cristo – que a devoção ao sagrado coração promove e fomenta cada dia mais – para estimular os cristãos a praticarem em sua vida a lei evangélica, sem a qual não é possível haver entre os homens paz verdadeira, como claramente ensinam aquelas palavras do Espírito Santo: "Obra da justiça será a paz" (Is 32,17)? [3]

Com esta exortação, Pio XII deixa claro aos homens de seu tempo, mas também para nós deste século XXI, que a verdadeira devoção ao Coração de Jesus deve nos inspirar o mesmo amor de Cristo em nossa vivência cotidiana, para que sejamos autênticos artífices do Evangelho e comunicadores do Reino de Jesus, "reino de verdade e de vida, reino de santidade e de graça, reino de justiça, de amor e de paz".

Jesus não é um injusto juiz, ávido por condenar e punir. É um juiz justo disposto a nos acolher em nossas fraquezas e de nos ajudar a nos reerguer. O Coração de Jesus “é a Porta do Senhor, pela qual os justos entrarão” (Sl 117,20). Porta constantemente aberta “não só para resguardar em seu âmago as almas puras e virtuosas, como também para receber novas Marias Madalenas, outros Zaqueus, e ainda os convertidos de última hora como o Bom Ladrão. Foi ele que assegurou que o sincero arrependimento levará ao céu publicanos e rameiras (Mt 21, 31-32)”. [4] Que deste modo, “atraídos ao seu coração, possamos beber, com perene alegria, na fonte salvadora”. [5]

Roma, 20 de junho de 2022.

Marcus Antonius Card. Di Vegesela

Pref. da Congregação para a Doutrina da Fé

 

[1] PIO XII. Carta Encíclica Haurietis Aquas, sobre o culto do Sagrado Coração de Jesus, 53.

[2] ADAM, Karl. O Cristo na fé, trad do alemão, 1962, pg 274.

[3] PIO XII. Carta Encíclica Haurietis Aquas, sobre o culto do Sagrado Coração de Jesus, 70.

[4] OLIVEIRA, Oscar. Sagrado Coração de Jesus, 1976, pg 85.

[5] MISSAL ROMANO, Prefácio: Coração de Jesus, Fornalha Ardente de Caridade.