SAGRADA CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ
A propósito de algumas dúvidas sobre o caráter definitivo da Doutrina da Carta Apostólica Ordinatio sacerdotalis
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Roma. 13 de Outubro de 2020.
INTRODUÇÃO
"Permanecei em mim, que Eu permaneço em vós. Tal como o ramo não pode dar fruto por si mesmo, mas somente permanecendo na videira, assim também acontecerá convosco, se não permanecerdes em mim" (Jo 15,4). Se a Igreja pode oferecer vida e salvação ao mundo inteiro é graças ao seu enraizamento em Cristo, seu Fundador. Este enraizamento se dá primeiramente através dos sacramentos, tendo a Eucaristia no centro. Instituídos por Cristo, os sacramentos são colunas de base da Igreja que a geram continuamente como Seu corpo e Sua esposa. Intimamente ligado a Eucaristia encontra-se o sacramento da Ordem, no qual Cristo se faz presente na Igreja como fonte da sua vida e de sua obra. Os sacerdotes são configurados "a Cristo sacerdote, de tal modo que possam agir em nome de Cristo cabeça."
Cristo quis conferir este sacramento aos doze apóstolos, todos homens que, por sua vez, o transmitiram a outros homens. A Igreja sempre se reconheceu vinculada a esta decisão do Senhor, que exclui que o sacerdócio ministerial possa ser validamente conferido às mulheres. A Congregação para a Doutrina da Fé, em resposta a uma dúvida sobre o ensinamento da Ordinatio sacerdotalis, reiterou que esta é uma verdade que pertence ao depósito da fé.
I - PREOCUPAÇÕES
Nesta perspectiva, causa séria preocupação ver surgir ainda em alguns países vozes que colocam em dúvida a definitividade desta doutrina. Para sustentar que tal doutrina não é definitiva, argumenta-se que a mesma não foi definida ex cathedra e que, uma decisão posterior de um futuro Papa ou Concílio poderia mudá-la. Semeando estas dúvidas cria-se grave confusão entre os fiéis, não somente sobre o sacramento da Ordem como parte da constituição divina da Igreja, mas também sobre o Magistério ordinário que pode ensinar a doutrina católica de maneira infalível.
II - PESPECTIVAS
Em primeiro lugar, no que refere-se ao sacerdócio ministerial, a Igreja reconhece que a impossibilidade de ordenar as mulheres pertence à «substância do sacramento» da Ordem (cf. DH 1728). A Igreja não tem capacidade de mudar essa substância, porque é precisamente a partir dos sacramentos instituídos por Cristo que ela é gerada como Igreja. Não se trata somente de um elemento disciplinar, mas doutrinal, enquanto refere-se à estrutura dos sacramentos, que são lugar originário do encontro com Cristo e da transmissão da fé.
Se a Igreja não pode intervir, é porque neste ponto intervém o amor originário de Deus. Ele opera na ordenação dos presbíteros, de modo que a Igreja tenha sempre, em cada situação da história, a presença visível e eficaz de Jesus Cristo «como fonte principal da graça» (Francisco, Evangelii gaudium, n. 104). A Igreja, consciente de não poder mudar essa tradição por obediência ao Senhor, esforça-se em aprofundar o seu significado, uma vez que o desejo de Jesus Cristo, que é o Logos, nunca é privado de sentido. O sacerdote, de fato, age na pessoa de Cristo, esposo da Igreja, e o seu ser homem é um elemento indispensável desta representação sacramental (cf. Congregação para a Doutrina da Fé, Inter insigniores, n. 5).
Em segundo lugar, as dúvidas levantadas sobre a definitividade da Carta Apostólica Ordinatio sacerdotalis também têm graves consequências no modo de compreender o Magistério da Igreja. É importante reiterar que a infalibilidade não diz respeito somente aos pronunciamentos solenes de um Concílio ou do Sumo Pontífice quando pronuncia-se ex cathedra, mas também o ensinamento ordinário e universal dos bispos espalhados pelo mundo quando propõem, em comunhão entre si e com o Papa, a doutrina católica a ser considerada definitiva.
Por outro lado, ninguém negará que o Magistério possa expressar-se infalivelmente sobre as verdades que são necessariamente relacionadas com o dado formalmente revelado, pois somente assim ele pode exercer sua função de guardar santamente e expor fielmente o depósito da fé.
III - A VERDADE
Neste tempo, em que a Igreja é chamada a responder aos muitos desafios da nossa cultura, é essencial que ela permaneça em Jesus, assim como os ramos na videira. É por isso que o Mestre nos convida a garantir que as suas palavras permaneçam em nós: «se guardardes os meus mandamentos, permanecereis no meu amor» (Jo 15,10). Somente a fidelidade às palavras de Cristo, que não passarão, assegura o nosso enraizamento nele e em seu amor. Somente a acolhida de seu sábio desígnio, que toma forma nos sacramentos, revigora as raízes da Igreja, a fim de produzir frutos de vida eterna.
+ Gabriel Souza Card. Giovanelli
Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé